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Afro-X - Tenho muito pra contar - Parte I EX-157
8:24h. Manhã de um dia qualquer de janeiro. Meu celular toca, não posso atender, ainda estou no banho. 8:50, o telefone toca novamente, combinamos o local para o encontro, saio sem tomar café, estou atrasado.
9:30. Estou no metrô Santa Cruz, recebo nova ligação, é o mesmo número que aparece no visor. “E aí negão, já estou aqui”. Digo que chegarei em 15 minutos, mesmo sabendo que levarei meia hora para chegar no lugar combinado. “Negão, vamos nos encontrar na rua mesmo, os estacionamentos estão muito caros. Você está com gravador aí né? Estou te aguardando”, ele diz.
A pessoa ao telefone, que me liga desde cedo, Cristian de Souza Augusto, o Afro-X, rapper ex-integrante do 509-E que participou de um filme premiado (Entre a Luz e a Sombra) , gravou um documentário (O Regenerado), escreveu um livro (Ex-157), se converteu ao cristianismo, está envolvido em projetos sociais e acaba de lançar o CD “Das Ruas Pro Mundo”. É evidente a sua vontade de se expressar, mostrar seu lado da história. Estamos há mais de um mês tentando nos trombar. Agora vai.
10:15. Mais que atrasado, chego ao ponto marcado, uma rua que fica no entorno da Nova Cracolândia, na região central de São Paulo. Afro-X está no carro, ao me aproximar, vejo que o MC observa dois moradores de rua dividindo um grande pedaço de bolo. “Firmeza negão, entra aí. Vamos trocar um ideia”. Após algumas ligações recebidas, Afro-X começa a falar, suas palavras saem de maneira pausada, seu olhar no retrovisor mostra um homem preocupado com o que acontece ao seu redor, todo instante.
Após o fim do 509-E, muitas pessoas viraram as costas para o trabalho de Afro-X, por outro lado, o MC conquistou e manteve o respeito de pessoas como os jornalistas Caco Barcellos, Gilberto Dimenstein, Josmar Jozimo, André Caramante, Diva Ferreira. Também teve apoio de Alexandre de Maio, do jornal Boletim do Kaos, e Marcos Caneta, agente cultural de São José (SC), entre outras personalidades do Rap e do Hip-Hop.
“Negro e pobre, Cristian resolveu buscar ascensão social com um revólver na cinta. Saiu derrotado e amargou anos nos presídios superlotados ...Para os da periferia, a severidade da Execução Penal e prisões podres; para os abastados, a proteção total”, afirma André Caramante, no prefácio do livro “Ex-157”, onde Afro-X relata parte de sua vida.
Artistas de outros estilos musicais como Badaui (CPM 22), Sandra de Sá, Edu Ribeiro, Carlos Dafé e Afroreggae participam do CD “Das Ruas Pro Mundo”. “Pessoas de outras áreas admiram meu trabalho, me respeitam. Durante o período de gravação do meu álbum, muita gente do Rap recusou meus convites, outros diziam que estavam com a agenda cheia. Não me abalei, continuei trabalhando com quem se identificou com minha proposta”, desabafa o rapper que produziu seu CD ao lado do DJ Tony Di.
11:00. A movimentação na rua aumenta, garotos drogados sobem e descem. Afro-X para por alguns instantes, observa, reclama do calor, seca o rosto suado e, ao me mostrar uma pasta com documentos, planilhas e comprovantes de depósitos da época do 509-E, me diz: “Negão, fiquei muito tempo calado. Está na hora de expor o meu lado. É a vez da verdade. Você está gravando aí ?”. Balanço a cabeça sinalizando um sim. Um nóia passa olhando para dentro do automóvel, ele tem a mesma cor da pele do entrevistado e do entrevistador. O garoto poderia ser um de nós. Muitos de nós estão na situação dele.
Afro-X esteve no submundo, conhece uma vida que o entrevistador apenas imagina. Sampleando a canção de Tim Maia - “Tenho muito pra contar... Dizer que aprendi” – Cristian de Souza Augusto fala de Rap, do seu antigo grupo, das desavenças, dos acordos e da vontade de viver sem tretas. Essa ideia vai rolar em breve, aqui no CHH.
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